quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Sobre um pioneiro

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Na década de 1970 iniciou-se no Brasil um movimento de executantes de música antiga. Costuma-se denominar assim a música composta antes do século XIX, quando a construção dos instrumentos, suas técnicas de execução, a teoria musical, e o lugar social da música eram tão diferentes do mundo moderno que convém pensar em outra categoria de música.

Os primeiros executantes brasileiros eram flautistas, cravistas ou gambistas que estudavam na Europa e vinham tocando o repertório europeu do início do barroco, ou ainda mais antigo. Desfrutavam de uma consolidada na Europa havia várias décadas, com publicação de partituras e tratados, além da disponibilidade de vários especialistas para se fazer aulas ou cursos.

Mais recentemente surgiram alguns outros curiosos que pensaram em executar não apenas música antiga, mas música antiga feita no Brasil, ou melhor, na América Portuguesa. Entre os que nadaram contra a corrente tentando recuperar o que foi a sonoridade do nosso passado histórico, estava um jovem estudante da Escola de Música e Belas Artes do Paraná.

Lá pelos idos de 1996 ele resolveu começar um grupo musical com vários estudantes. Coro e orquestra. O mentor do grupo seria também o regente (e esse era seu primeiro trabalho como maestro, por volta dos 20 anos de idade). As partituras vinham do trabalho musicológico de um professor do curso - Harry Crowl, resultado do período em que trabalhou como pesquisador da Universidade Federal de Ouro Preto.

O nome o grupo era Americantiga. O nome do regente Ricardo Bernardes. Este blogueiro que vos escreve participou do coro e também executou baixo contínuo ao violão.

O grupo chegou a gravar um CD (do qual não participei). Fez vários concertos. Mas se acabou quando o regente mudou-se para São Paulo a fim de buscar maiores oportunidades profissionais.

Depois de longo tempo sem contato, descubro que meu colega Ricardo Bernardes já defendeu dissertação de mestrado em musicologia na USP, sobre uma obra de José Maurício Nunes Garcia. É agora doutorando em Austin (Texas), e o grupo Americantiga continua ativo.

Executou recentemente um concerto em Washington, a convite da embaixada brasileira e como parte das comemorações dos 200 anos da corte portuguesa no Rio de Janeiro.

Assisto aos vídeos do concerto, e percebo o quanto evoluiu o nosso maestro e seu grupo. Extremo profissionalismo. Instrumentos de época. Execução precisa e cuidadosa. Interpretação com autenticidade tanto no que toca ao período joanino como ao atual (um grande dilema para quem trabalha com música antiga).



A obra executada é de Marcos Portugal, preferido de D. João VI e que passou o fim de sua gloriosa carreira no Rio de Janeiro.

Vida longa ao Americantiga, que, aliás, tem um excelente canal no Youtube...

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